Igreja Matriz da Paróquia São Miguel Arcanjo, em Piquete, SP, elevada à condição de Santuário Diocesano no dia 29 de Setembro de 2022.
Pároco e Reitor do Santuário: Pe. Fernando Sampaio.
No final dos anos 30, um amplo projeto de ampliação da Fábrica de Pólvora de Piquete levou à contratação de grande número de operários. Consequentemente, houve crescimento de nossa população. Iniciou-se uma política social de assistência aos funcionários e a construção de vilas operárias. Cresceu a cidade, com mudança na geografia urbana e dilatação de seu perímetro, que se aproximou da Mantiqueira.
A Matriz de São Miguel, ao redor da qual o primitivo núcleo urbano se desenvolveu, tornou-se pequena.
O crescente progresso e o aumento da população católica exigiam a construção de uma nova Matriz que fosse, ao mesmo tempo, demonstração da fé dos moradores e atestado da força religiosa do povo.
Assim, em junho de 1960, com autorização da Cúria Diocesana, foi adquirido um amplo terreno na Rua Cel. Luiz Relvas, região central da cidade, para a construção da nova igreja. Em outubro desse mesmo ano, quando da visita pastoral do 3o Bispo de Lorena, D. José Melhado Campos, à Paróquia de São Miguel, a ideia da nova matriz era ventilada a toda hora. Foi elaborado para a ocasião um extenso programa do qual constou, além de crismas e ofícios religiosos, uma visita à parte social da FPV e às obras da sonhada Santa Casa. No edifício da prefeitura instalou-se a Sessão Solene, à qual compareceram autoridades civis, militares e a comunidade. O presidente da Câmara, Ver. Alony O. Soares, conduziu os trabalhos. O Ver. Prof. José Armando de C. Ferreira saudou o homenageado. Após, falou o prefeito Luiz Vieira Soares, assumindo, a seguir, a tribuna, D. José Melhado Campos, que proferiu grande peça oratória, concitando todos a trabalhar de mãos dadas pelo engrandecimento de Piquete e da Religião, tudo pelo bem-estar do povo.
Encerrando a Sessão, à saída do edifício, o vereador Gabriel Benfica Nunes falou ao bispo do desejo e disposição de todos para ereção da nova matriz. Estabeleceu-se, logo, uma “mesa redonda”, demonstrando D. Melhado Campos sua grande compreensão e aquiescência.
Ficou então deliberado o lançamento da pedra fundamental para o domingo, dia 9 de outubro, às 11h. Essa solenidade contou com a presença de inúmeras pessoas e autoridades civis, militares e eclesiásticas. Nessa ocasião, foi iniciada a campanha, por um grupo de senhoras, para se angariar tijolos e outros donativos a fim de se levar a bom êxito as obras do novo templo católico. Sobre o acontecimento falaram o professor João Vieira Soares e o Cônego Gabriel Hiran, encerrando com palavras de estímulo o bispo diocesano. Essa visita encheu de ânimo os piquetenses. O assunto na cidade passou a ser a futura matriz, e toda a população se mobilizou.
No mês seguinte, no dia 20, reuniu-se a comissão de senhoras encarregadas da campanha para a construção da igreja. Foi constituída tesoureira da comissão Dona Carmem Amoroso, que prestou contas do total já arrecadado no livro de ouro, isto é, Cr$ 157.000,00. Esse total correspondia às doações dos senhores Oswaldo Coelho Nunes, Expedito Ferreira, José Bertolino Ribeiro, Vicente Freitas, Brigadeiro Ovídio Beraldo, Ismael Marque, Osvaldo Beraldo, Diocesano Ramos, Dr. José Amoroso, Dr. Vitório Amoroso, Antônio Teixeira Neto, Arthur Alves, José Gomes Siqueira, Ari de Melo Franco, José Leite da Silva e José Crispim de Meireles. Foram estas as primeiras contribuições para as obras. Ao término da reunião, o pároco de Piquete, Pe. Gabriel Hiran, agradeceu o eficiente trabalho da comissão e a boa vontade dos que haviam colaborado para essa grande obra. A partir daí, num trabalho constante, que teve à frente a carismática figura do Dr. José Amoroso, a população se empenhava cada vez mais para a construção de nossa nova matriz.
A Paróquia de São Miguel completa 130 anos. Conhecer sua história e os caminhos percorridos por seus paroquianos ao longo desses anos leva-nos às origens de Piquete, à primeiras famílias que se instalaram por estas terras e ao processo de evangelização que se deu entre os moradores e concorreu para que se mantivessem unidos por meio das palavras de Cristo.
Para conhecer a história é preciso recorrer a documentos antigos. Desde os primórdios de nossa colonização, a Igreja teve papel fundamental como guardiã de memórias. Os livros de tombo das igrejas matrizes são verdadeiros relicários de registros de dados históricos. Foi ao redor das capelas que muitos lugarejos surgiram. Até a República, um núcleo populacional, para ser constituído como Vila e receber autonomia, teria necessariamente que passar pelas etapas de aglomerado, bairro e freguesia. Além disso, devia ter um órgão fiscal provedor das necessidades para controle do movimento de cargas e mercadorias – no caso de Piquete, o registro ou barreira. Também deveria contar com uma capela curada, com padre fixo e devidamente provisionado, isto é, registrado no órgão eclesiástico hierarquicamente superior – no nosso caso, a Diocese de São Paulo. Era a Igreja que, por meio da Paróquia, dirimia as questões de âmbito público e privado.
As terras que deram origem a Piquete pertenciam a Guaratinguetá. Eram, até o final do século 18, habitadas pelo povo Puri. Nômades, esses índios deixaram trilhas abertas que cruzavam a Mantiqueira, a qual transpunham atrás de caça e pinhão.
Com a descoberta do ouro no Sertão dos Cataguazes, em 1693, cresceu o movimento sertanista no Vale do Paraíba. Inúmeras outras minas de ouro são descobertas. Por volta de 1703, a de Itajubá, próxima ao rio Santo Antônio, na vertente mineira da Mantiqueira. Em terras então guaratinguetaenses foi erguida, por volta de 1705, uma capela de Nossa Senhora da Piedade, junto ao porto de Guaypacaré. O adensamento populacional em torno dessa capela concorreu para que ela fosse elevada à condição de Freguesia em 1718. As terras piquetenses passaram, então, a pertencer à Vila de Guaypacaré. Em 1730, Antônio Domingues Pereira, um dos fregueses dessa igreja ganhou uma sesmaria na margem esquerda do Paraíba, próxima à Mantiqueira, na região da barra dos ribeirões Embaú, atual Rio Piquete, e Itabaquara. Aí se instalou com sua mulher e criaram uma família numerosa, que se tornaria uma das mais importantes de Lorena. Outras sesmarias foram doadas e novas famílias foram instaladas formando roças de subsistência.
Em 1741, Lázaro Fernandes, que vivia afazendado na margem esquerda do Paraíba, aproveitando uma antiga trilha dos Puris, abriu um caminho que, partindo de suas terras na Freguesia da Piedade, atingia o arraial serrano de Soledade do Itajubá, atual Delfim Moreira.
Com o aumento do trânsito por esse caminho, os Puris foram cada vez mais rechaçados para a Mantiqueira e Sul de Minas.
Em dezembro de 1770, desejou o Capitão-General de São Paulo “formar uma aldeia” com os Puris com o intuito de civilizá-los, doutriná-los na fé cristã e vesti-los com os “panos da honestidade” para que “fizessem nova entrada levando uma índia velha para que ela persuadisse todos os índios do seu povo que descessem e que formassem uma aldeia com um pároco”. Assim foram atraídos para o convívio civilizado dos brancos numerosos indígenas designados “administrados”, mas que, de fato, eram servos dos conquistadores do Hepacaré.
Arrancados de seu habitat, submetidos às estranhas normas de trabalho e costumes, esse índios, desajustados, não encontraram condições favoráveis para a sobrevivência. Perdiam o gosto pela vida, tornavam-se apáticos e, em grande parte, definhavam até que a morte os libertasse.
O caminho aberto em 1741, que passava por onde hoje se encontra Piquete, era para abastecimento das Minas de Itajubá e tornou-se, com o passar dos anos, responsável pelo intercâmbio comercial entre as províncias de São Paulo e Minas Gerais. Por ele foi gradativamente aumentando o tráfego de tropeiros, boiadeiros, mascates que se arranchavam ao longo da estrada, próximo ao Registro (posto fiscal) aí instalado, em 1764, para cobrança fiscal e evitar o desvio do ouro vindo das Minas Gerais. Muitos desses tropeiros se fixaram às margens da estrada, tornando-se pioneiros no processo de povoamento na região.
Surgiram casas de vendas e negócios e os produtos de suas roças passaram a servir para troca com as tropas que vinham de Minas ou dos portos de Mambucaba e Parati.
Esse agrupamento humano deu origem ao Bairro do Piquete, que teve sua população aumentada com a chegada da cultura cafeeira à região.
Houve um aumento da população escrava, necessária para trabalhar a lavoura e novos povoadores fixaram-se ao longo do caminho, com predomínio de famílias mineiras.
A religiosidade dos moradores era grande. Não havia pouso de tropeiros sem uma capelinha ou oratório. E a proximidade do Bairro do Piquete com a Capela de Nossa Senhora Aparecida suscitava a vinda de tropas e romarias que aqui se arranchavam.
Esses romeiros, vindos de povoações do Sul de Minas, formavam comitivas e vinham de longe, somando-se ao grupo pessoas de diferentes paragens: marchavam sob sol, chuva, sofrendo nas passagens dos rios ou na aspereza das subidas mantiqueiras, impulsionados pela fé.
Essa religiosidade levou os moradores, em 1864, a se reunirem através de uma petição, encabeçada por Joaquim Vieira Teixeira Pinto, visando à ereção de uma Capela no Piquete sob a invocação de São Miguel, o que foi concedido por Dom Sebastião Pinto do Rego, bispo de São Paulo.
Conseguida a concessão para a construção da Capela, não era permitido erguê-la em lugar ermo e despovoado, o que evidencia um adensamento populacional do Bairro.
A autorização dependia, sempre, da existência de uma povoação, pois, sem a ajuda dos moradores, era impossível levantar uma capela.
Com as obras de construção em andamento, esta passou a ser local de encontros sociais e centro aglutinador das aspirações dos moradores. Nascia o espírito comunitário na população, que discutia problemas comuns e passavam a reivindicar melhoria e progresso para o Bairro.
A comunidade passou a se articular visando ao crescimento e à autonomia política. O primeiro passo dado foi a elevação do Bairro à condição de Freguesia, o que ocorreu em 22 de março de 1875.
Entre os moradores, três lideranças políticas, o major Joaquim Vieira Teixeira Pinto, seu irmão, Custódio Vieira da Silva, e o tenente José Mariano Ribeiro da Silva, estiveram à frente das obras de construção da igreja e na defesa dos anseios da comunidade piquetense na Câmara de Lorena. Custódio Vieira foi quem doou a pequena imagem de São Miguel, em madeira, para o altar mor da Capela. Por volta de 1886, a Igreja estava construída e já contava com todos os paramentos litúrgicos e alfaias, mas não tinha padre colado, apesar dos inúmeros pedidos da comunidade à Diocese. Um novo abaixo assinado com mais de cem assinaturas foi encaminhado e a população finalmente atendida.
Vimos, anteriormente, que durante o Império, devido à estreita ligação entre a Igreja Católica e o Estado, a Freguesia tinha, além de sua condição eclesiástica, a jurídica frente ao poder civil. E era este poder civil que traçava suas divisas territoriais e mantinha sua sede na Capela, tornando-a adstrita às autoridades de Lorena. Para a Freguesia foi adotado o nome do padroeiro, São Miguel.
Em 7 de outubro de 1888, tornamo-nos Paróquia e já em 1º de novembro, com grande recepção popular tomou posse nosso primeiro vigário, padre Francisco Fillipo, que, infelizmente, logo foi embora. Transferiu-se para a igreja de Santo Antônio, em Machado, no Sul de Minas Gerais.
A população aspirava à emancipação do Bairro. Era preciso, então, uma matriz. O comendador Custódio Vieira da Silva construiu, nas proximidades da igreja, uma olaria para fornecer tijolos para as torres laterais. Em maio de 1891, ocorreu, finalmente, a emancipação político-administrativa do Bairro do Piquete, e a 15 de junho de 1891 tomaram posse os Intendentes da nova Vila Vieira do Piquete. No Natal desse mesmo ano, foram concluídas as torres da igreja.
Quando de sua emancipação, a Vila era muito pequena e pobre. Sua população urbana não ia além de seiscentas pessoas, com pouco mais de cento e vinte casas localizadas próximo à igreja Matriz. “A pobreza do lugar não permitia a vinda de vigário, porque nenhum sacerdote poderia aqui viver por falta de recursos pecuniários que provessem sua subsistência, não obstante ser a população devota e muito religiosa e concorrer particularmente para dar de comer ao vigário”.
A Igreja Matriz, apesar da ausência de padre, sempre foi o centro espiritual de Piquete. Por outro lado, o catolicismo popular sustentava-se autonomamente.
Sem o apoio doutrinal, passou a ocupar a primazia na vida religiosa do povo o culto dos santos. Essa prática era fortalecida por uma antiga tradição e desenvolvia-se pelas famílias nas casas, pelas comunidades de vizinhança, nas capelas e nas festas e quermesses, aos santos de devoção (São Miguel, São Sebastião, Santa Cruz, São José, São Benedito, São Bom Jesus etc).
Desde a ida do padre Francisco Filippo, em 1890, não tivemos padre fixo na paróquia. A chegada da congregação salesiana a Lorena fez com que esses religiosos dessem assistência espiritual esporádica à Paróquia de São Miguel. Vez ou outra, um padre redentorista vinha em missão assistir aos paroquianos. Na chegada do ano de 1900, o famoso missionário Pe. Bartolomeu Tadei, vem pregar em Piquete, difundir o culto ao Sagrado Coração de Jesus e funda o Apostolado da Oração. Num trabalho de mutirão com a comunidade, instala, no morro em frente à Matriz, um santo cruzeiro, como marca da chegada do novo século.
Durante anos, a paróquia de São Miguel esteve anexada ora à estola do Embaú, ora à de Lorena, quando éramos visitados esporadicamente por religiosos. O padre que por mais tempo permaneceu assistindo aos paroquianos foi José Arthur de Moura, vigário de Lorena. A ele a Paróquia deve a grande reforma, em 1928, da Matriz, que se encontrava com sua taipa e o telhado comprometidos.
Padre definitivo só tivemos a partir de 3 de fevereiro de 1934, quando o padre João Marcondes Guimarães tomou posse da paróquia de Piquete. Com a chegada do padre João, aos poucos foi crescendo a espiritualidade do povo e começaram a florescer as associações religiosas (Congregação Mariana, Pia União das Filhas de Maria, Apostolado da Oração, Associação de São José, Irmandade de São Benedito, Cruzada Eucarística Infantil), além do grande incremento das obras assistenciais e de caridade. Crescia, também, a catequese na igreja Matriz, nas capelas urbanas e nos bairros rurais.
O substituto do padre João, padre Oswaldo Bindão, continuou o belo trabalho de seu antecessor. Fez com que a seara, já cultivada, produzisse colheitas cada vez mais abundantes, com maior presença e participação dos fieis nos trabalhos comunitários. Fundou o jornal A Ordem, “dedicado aos interesses sociais e religiosos de Piquete”. Mais tarde o jornal passou a ser o órgão oficial da Diocese de Lorena. Depois dele, muitos outros sacerdotes dirigiram a nossa paróquia: Pe. Septímio, Pe. José Braz, Pe. Eufrázio, Pe. Melquíades, Pe. Mathias, Pe. Juca, Pe. João Hipólito (que foi Bispo Diocesano de Lorena), Pe. João Batista, Pe. Hiran, os irmãos Pe. Joaquim e Pe. José, Pe. Pedro, Pe. Alexandre, Pe. Tarcísio, Pe. Luiz Carlos, Pe. Cícero, Pe. Lázaro, Pe. João Bosco e, atualmente, Pe. Fernando Sampaio.
Não podemos nos esquecer da grande contribuição das mulheres no processo de evangelização: professora Leonor Guimarães, Nair Porfírio, Maria de Lourdes Ferreira (dona Mariquinha), Ester Vieira Soares (irmã Maria Adelaide do Precioso Sangue), dona Emília Marques de Almeida, Maria Lucas e tantas outras…
Em 1948 chegaram as Filhas de Maria Auxiliadora (as Irmãs Salesianas), que, por anos, trabalharam evangelizando crianças e minimizando as dores física e espiritual dos piquetenses. As Irmãs mantiveram por vários anos o orfanato Madre Maria Mazzarelo. Obra salesiana mantida em Piquete há mais de cinquenta anos é o Oratório São Domingos Sávio.
Grande, ainda, foi o trabalho de muitos homens, legítimos exemplos de piedade cristã, que devotaram parte de suas vidas às obras da Igreja: José Vieira Soares, José Chrispim de Meireles (Zequinha Meireles), Joaquim Sacristão, Salviano, Décio Guimarães, Joaquim Vaz, João Ramos e outros…
Ao comemorarmos os 130 anos da Paróquia de São Miguel, como parte de um processo contínuo de evangelização, devemos resgatar e preservar as tradições e a cultura popular, ir ao encontro de nossas raízes, pois a evangelização só se dá com o diálogo entre o evangelizador e a comunidade detentora dessas tradições e da cultura. Nesse intercâmbio, o Evangelho é acolhido no cotidiano da vida do povo, de modo que ele possa “expressar sua experiência de fé em sua própria cultura”. É a “inculturação”.
Daí a importância de resgatarmos em nossas festas religiosas o seu lado popular folclórico. Além das procissões, as quermesses com seus festeiros, leilões, bandas de música… Essas festas sempre fizeram parte da “alma piquetense”.
Se quisermos transformar a sociedade de Piquete, com mais amor, paz e vida plena, e acabarmos com a violência e as injustiças sociais, é preciso que arregacemos as mangas, deixando de lado nosso imobilismo, e comecemos a participar efetivamente em prol de uma sociedade mais justa e fraterna.
Como diz São Tiago no capítulo 2, versículo 26, “A fé sem obras é morta”. Hoje, mais do que nunca, temos que traduzir a nossa fé em ações concretas.
Pesquisa de Antônio Carlos Monteiro Chaves
Textos publicados no informativo O ESTAFETA, Edição 261, de outubro de 2018, comemorativa dos 130 anos da Paróquia São Miguel.
Não tem como escapar: quem visita Piquete, ao percorrer as ruas da cidade sempre volta o olhar para a Matriz de São Miguel Arcanjo. Muitas fotos são tiradas para registrar essa construção, seus vitrais e o campanário que se destacam na paisagem. Construção dos anos 60, o projeto do arquiteto Prometheu da Silveira, seu idealizador, chama a atenção pelas linhas arrojadas, com toques de ousadia. Quando sua maquete foi apresentada para apreciação da comunidade piquetense, tornou-se alvo de discussão entre alguns paroquianos que não a aprovavam por achá-la moderna demais. No entanto, com o passar do tempo, a nova igreja caiu no agrado da população e está aí, sem nenhuma “rival” na região no que diz respeito à arquitetura.
Desde os anos 40, a população de Piquete almejava a construção de uma nova igreja matriz. A obra viria substituir a antiga, do século XIX, que já não oferecia condições para abrigar o crescente número de fiéis. Paróquia pobre, foi graças ao esforço, generosidade e trabalho dos fiéis que se comprou um terreno para sua edificação.
Em 1960, o arquiteto Prometheu da Silveira, em visita a Piquete, foi abordado no Cassino dos Oficiais, na Vila da Estrela, por um grupo liderado pelo Dr. José Amoroso, que lhe pediu para projetar uma nova igreja matriz para a cidade.
Poucas vezes um profissional recém-formado teve oportunidade de executar um projeto tão importante para uma comunidade. Após conhecer o terreno adquirido para a obra e de posse das plantas do lugar, propôs trabalhar sem ônus para a comunidade. A forte imagem que lhe ficara quando da visita ao terreno, as condições topográficas do lugar e os significados culturais e simbólicos da religião católica determinaram o desenho do edifício: um tetraedro (poliedro regular, em forma de pirâmide, com quatro faces triangulares iguais). A planta do terreno, também triangular, dominada pelo número três, místico por sua conotação religiosa: fé, esperança e caridade – Pai, Filho e Espírito Santo.
Os primeiros estudos do conjunto – matriz e casa paroquial – foram apresentados em Piquete e aprovados pelo bispo diocesano Dom José Melhado de Campos. A disposição do terreno permitiu a implantação de uma praça ampla e fronteiriça ao templo, com dois acessos: pela Rua Coronel Luiz Relvas e pela Avenida 15 de Março, com entrada ao lado do Pórtico da FPV. O desenvolvimento do projeto se processou buscando atender ao imperativo das normas a que um edifício religioso deve satisfazer, bem como às implicações das acomodações da Casa Paroquial, como residência do pároco, e da escola primária que seria implantada, conforme solicitação da Comissão Construtora da Matriz.
A estrutura dominante – vigas convergentes no vértice do tetraedro – e as interpretações dos planos da cobertura e das faces verticais do sólido induzem a atenção para o alto; a simplicidade da ornamentação – a cruz, símbolo do sacrifício de Jesus, o altar em mármore em forma de cálice, o sacrário com a lâmpada votiva, presença constante d’Ele, e a imagem de São Miguel, escultura do professor César Dória, formam um conjunto harmônico, de leitura simples e marcante para os fiéis. O fundo negro entonado do azul dos vitrais cria a atmosfera propícia à introspecção e ao encontro em cada participante da liturgia com sua fé.
O arquiteto Prometheu da Silveira não pôde acompanhar a construção desse templo. A tarefa coube ao engenheiro militar major Pitta Xavier, que fez algumas modificações no projeto original em função de imposições do Concílio Vaticano II (1962-1965). A recomendação era para que os templos evitassem excessos de decoração e pompa. Com essa maior liberdade, a arquitetura moderna religiosa foi aceita totalmente na década de 70. O projeto do arquiteto Prometheu da Silveira estava afinado com a orientação da Santa Sé.
Para a edificação da nova igreja matriz de São Miguel Arcanjo houve grande mobilização dos paroquianos. Dessa forma, o templo foi erguido em tempo recorde. Foram muitas quermesses, rifas, carnês e doações. Inaugurada em janeiro de 1970, a nova matriz tornou-se patrimônio arquitetônico referencial de Piquete. É testemunha da história e de sua importância em nossa vida. É um bem espiritual, cultural e social, cujos valores são insubstituíveis.
Antônio Carlos Monteiro Chaves
Publicado no informativo O ESTAFETA, edição 164, de Setembro de 2010
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